Os números
oficiais das agências encarregadas, assim como os meios de comunicação
(imprensa escrita, rádio, televisão, redes sociais, etc.) e o senso comum
manauara indicam, sem surpresa, que as zonas norte e leste de Manaus constituem
as regiões que mais sofrem com o problema do desabastecimento de água na cidade.
Conformados, lemos no jornal uma reportagem que destaca o diretor da Manaus
Ambiental-Águas do Amazonas (empresas encarregadas do abastecimento de água e
esgoto) assegurando que não há problema com a produção de água na cidade, mas sim
com a sua distribuição: produz-se 8,8 mil litros de água a cada segundo, o que
é suficiente para abastecer com tranquilidade toda a capital, tornando universal
o acesso à água tratada entre os manauenses (Diário do Amazonas, 23/09/2012).
O que explica a
falta de água nas zonas norte e leste de Manaus mesmo diante de uma produção
tão ampla deste recurso?
Este
diagnóstico da distribuição da água não constitui um caso isolado em Manaus ou
em qualquer sociedade cujo modelo de desenvolvimento está baseado na exploração
predatória dos recursos naturais e humanos, sem a necessária consideração aos aspectos
sociais e sustentáveis. Outro fato que nos permite entrever esta situação é
visualizado pelo diagnóstico da produção econômico da cidade. Manaus ocupa o 6º
lugar no ranking das cidades mais ricas do Brasil, perdendo somente para São
Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Curitiba e Belo Horizonte (IBGE, 2012). A
riqueza produzida aqui se aproxima dos R$ 40 bilhões de reais por ano! Por
outro lado, os índices sociais da cidade a colocam entre as mais vulneráveis do
país. Retornando ao caso do abastecimento d´água, constata-se a precariedade
desse serviço em 80 mil residências, o que representa cerca de 312 mil pessoas
padecendo a falta d´água[1].
Ademais, a situação do saneamento básico (direito de cidadania) insere Manaus
entre as 20 piores cidades do país (IBGE, 2010). Novamente, as zonas norte e
leste destacam-se entre as regiões mais maltratadas.
Ora, sabemos
que a população das mencionadas regiões da cidade (onde os serviços e direitos
básicos são mais violados) é formada na sua maioria por pessoas que constituem
as classes mais populares, que possuem baixo poder aquisitivo. Fica evidente na
cidade de Manaus o predomínio de uma lógica econômica e social que consolida a
estreita relação entre a alta concentração de renda e privilégios, os altos
índices de pobreza e os precários serviços públicos. A riqueza existe, mas ela favorece
de forma privilegiada a uma pequena parcela da população: a elite empresarial da
cidade. A lógica empresarial de exploração não promove o benefício social e
coletivo, uma vez que uma parcela significativa dos moradores vive os efeitos
da exclusão (a pobreza, o analfabetismo, a má qualificação profissional, a
precária qualidade de vida, etc.), visibilizando, assim, a desigualdade social.
Neste ínterim, os direitos de cidadania se transformam em meros discursos nos
palanques eleitorais e se convertem em meras teorias sociológicas entre os
estudiosos da academia. A universalização dos serviços públicos vira argumento
para a privatização, alimentando o ciclo de acumulação da renda.
Este
procedimento tem repercutido também no meio ambiental. A atual crise ecológica
mostra que a busca desenfreada do lucro em larga escala também promove o
desequilíbrio entre as forças da natureza, prejudicando a fauna e a flora, intensificando
as catástrofes naturais e colocando a vida em perigo (a vida humana e as de
milhares de espécies). O modelo de exploração econômica, propulsor da ideologia
do progresso ad infinitum às custas
de uma relação assimétrica com a natureza foi assimilado na contemporaneidade
com empolgação, gerando uma grande incógnita em relação ao futuro do planeta. A
humanidade descobriu a fórmula de destruição da vida planetária e está seguindo
fielmente as orientações necessárias para alcançar este fim. A questão
ecológica nos mostra que um modelo econômico que promove a maximização dos benefícios
para poucos, subestimando o valor e a dignidade de muitos põe em risco a vida
de todos.
Para coroar o
drama de nossa sociedade, deparamo-nos com situações em que os protestos[2]
contra a falta d’água (direito inalienável) são sufocados em meio à violência
policial, demonstrando a conivência de um Estado que legitima a desigualdade social
usando a força para calar a voz daqueles que ousam expor as suas contradições.
As eleições sempre abrem expectativas para o novo. Esperamos que os
representantes do povo manaura sejam dignos de assumir os cargos que a eles
foram confiados, trabalhando para a implementação e universalização dos
direitos básicos da população: água, transporte, saúde, educação, cultura,
trabalho, etc.
Sandoval Alves Rocha, 08 de
Novembro de 2012.
[1] A média
de moradores por domicilio em Manaus corresponde a 3,90 hab (IBGE, 2010).
[2] Protesto de moradores contra a
falta d’água termina em confronto com a polícia no bairro Tancredo. Neves - zona
leste de Manaus. (Acrítica, 05/11/2012).
Nenhum comentário:
Postar um comentário